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RECOMENDAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO – Bem-estar animal RECOMENDAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO – Bem-estar animal

11/07/2023 Assessoria de Imprensa

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL, por seu Promotor de Justiça signatário, no uso das atribuições que lhe foram conferidas pelo artigo 129, II, da Constituição Federal de 1988, art. 27, parágrafo único, inciso IV, da Lei Federal no 8.625/1993 (Lei Orgânica Nacional do Ministério Público), art. 56 do Provimento no 71/2017-PGJ, da Procuradoria-Geral de Justiça, bem como na Resolução n° 164/2017, do Conselho Nacional do Ministério Público;

 

CONSIDERANDO que é dever do Poder Público e da coletividade a defesa e a preservação do meio ambiente para as presentes e futuras gerações (art. 225, inciso V, §1o, da CF/88), cumprindo-lhes, em especial, a proteção da fauna e da flora, vedadas, na forma da lei, as práticas que submetam os animais à crueldade (inciso VII do § 1o do art. 225, CF/88, e inciso VII do § 1o do art. 251 da CE/89);

 

CONSIDERANDO que o mesmo texto constitucional, em seu art. 129, inciso II, estabelece que é função institucional do Ministério Público zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo as medidas necessárias à sua garantia;

 

CONSIDERANDO que a Constituição Estadual estabelece, em seu art. 13, V, que é competência do Município, além da prevista na CF/88 e ressalvada a do Estado, promover a proteção ambiental, coibindo práticas que ponham em risco a função ecológica da fauna e da flora, provoquem a extinção da espécie ou submetam os animais à crueldade;

 

CONSIDERANDO o art. 32 da Lei dos Crimes Ambientais (Lei no 9.605/1998), que tipifica penalmente os maus-tratos contra animais, proibindo atos de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais nativos ou exóticos, domésticos, domesticados ou silvestres;

 

CONSIDERANDO o art. 22 da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro LINDB (Decreto-Lei no 4.657/942), que determina que a interpretação de normas sobre gestão pública deve considerar os obstáculos e as dificuldades reais do gestor e as exigências das políticas públicas a seu cargo sem prejuízo dos direitos dos administrados;

 

CONSIDERANDO a recente Lei no 14.228/2021, que proíbe a eliminação de cães e gatos pelos órgãos de controle de zoonoses, canis públicos e estabelecimentos oficiais congêneres;

 

CONSIDERANDO que a Lei no 13.426/2017, ao dispor sobre a política de controle da natalidade de cães e gatos, determina que a esterilização de animais será executada levando em conta: (I) o estudo das localidades ou regiões que apontem para a necessidade de atendimento prioritário ou emergencial; (II) o quantitativo de animais a serem esterilizados, por localidade, necessário à redução da taxa populacional em níveis satisfatórios, inclusive os não domiciliados; e III - o tratamento prioritário aos animais pertencentes ou localizados nas comunidades de baixa renda.

 

CONSIDERANDO que a Lei Estadual no 15.363/2019, que consolida a legislação relativa à Proteção aos Animais no âmbito do Estado do Rio Grande do Sul, dispõe que é vedado ofender ou agredir fisicamente os animais, sujeitando-os a qualquer tipo de experiência capaz de causar sofrimento ou dano, bem como as que criem condições inaceitáveis de existência, assim como que é vedado sacrificar animais com venenos ou outros métodos não preconizados pela Organização Mundial da Saúde (OMS), nos programas de profilaxia da raiva (art. 1o, § 1o);

 

CONSIDERANDO o art. 29 do Decreto no 6.514/2008, que dispõe sobre as infrações e sanções administrativas ao meio ambiente e estabelece o processo administrativo federal para apuração das infrações de atos de abuso, maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos;

 

CONSIDERANDO a Resolução no 1.236/2018 do Conselho Federal de Medicina Veterinária (CFMV), que em seu art. 5° define e caracteriza maus-tratos;

 

CONSIDERANDO a Declaração Universal dos Diretos dos Animais, documento esse que reconhece e determina que todos os animais têm direito à vida, respeito e proteção do homem, salvaguardados de maus-tratos;

 

CONSIDERANDO os inúmeros flagrantes de maus-tratos, quase que diariamente, aos animais e, também, o constante número de abandonos de cães, gatos, cavalos e outras espécies animais;

 

CONSIDERANDO a crescente preocupação da sociedade quanto ao bem-estar animal e o impedimento ético e legal de crueldade, abuso e maus-tratos contra animais;

 

CONSIDERANDO a omissão do Município quanto ao desenvolvimento de políticas públicas voltadas à proteção de animais;

 

CONSIDERANDO que a omissão de cuidados com a saúde de animais pode representar, inclusive, riscos à saúde humana;


 

CONSIDERANDO a instauração do Procedimento Administrativo de acompanhamento de políticas públicas no 00762.003.086/2022, tendo por objeto acompanhar a política pública bem-estar animal no município de Mariano Moro;

 

CONSIDERANDO, por fim, incumbir ao Ministério Público a defesa da ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais indisponíveis, dentre os quais se destaca o meio ambiente sadio e ecologicamente equilibrado, bem como a proteção da saúde pública, e que é sua função institucional zelar pelo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição Federal, promovendo as medidas judiciais e extrajudiciais necessárias para a sua garantia (CF/88, arts. 127 e 129, II), bem como tendo presente que é atribuição do Ministério Público Estadual expedir Recomendações, visando a melhoria dos serviços públicos e de relevância pública, bem como ao respeito dos interesses, direito e bens cuja defesa lhe cabe promover nos termos das normas referidas na epígrafe da presente recomendação:

 

RECOMENDA AO(À) SR(A). PREFEITO(A) MUNICIPAL DE MARIANO MORO que, no prazo de 6 meses, crie e mantenha no âmbito do Município políticas públicas, por meio de lei municipal, que prevejam proteção aos animais vítimas de maus-tratos, aos animais de rua (não comunitários), aos animais abandonados, bem como aos animais vítimas de acidentes, estabelecendo:

(1) O texto do Projeto de Lei Municipal (PL) bem como seu respectivo encaminhamento à Câmara de Vereadores, e caso ainda não exista no âmbito do Município que contemple os conteúdos referidos nos itens 2 a 11 desta Recomendação, abaixo arrolados;

 

(2) Local, próprio ou contratado, com estrutura adequada e profissionais habilitados para transporte, recepção, atendimento emergencial, tratamento, esterilização (castração), vacinação, reabilitação, microchipagem, identificação e registro, encaminhamento provisório e encaminhamento definitivo, conforme o caso, de animais (em especial animais domésticos vítimas de maus-tratos, animais de rua não comunitários, animais comunitários, animais abandonados ou animais vítimas de acidentes, incluindo aqueles que tenham sido apreendidos em decorrência de práticas ilegais), mantendo de forma permanente e sem interrupção este serviço e com capacidade operacional para atender a demanda existente no Município;

 

(3) Que o encaminhamento provisório se dê em Centro de Bem-Estar, Hospital Público Veterinário ou, ainda, outro estabelecimento conveniado ou contratado, que conte com estrutura adequada para cuidados e alimentação dos animais;

 

(4) Que o encaminhamento definitivo dos animais se dê por meio de medidas. Como adoção, soltura na natureza (conforme o caso) ou, em caso de impossibilidade de reabilitação do animal, no centro de bem-estar ou em outro local custeado pelo Poder Público, que conte com estrutura adequada para abrigar os animais, bem como fornecer cuidados e alimentação, de forma a garantir o seu bem-estar e sua vida digna enquanto se mantiverem sob custódia da municipalidade;

 

(5) Que a eutanásia seja regulamentada para que sua utilização seja realizada de modo excepcional e motivado, e como medida apta a evitar o sofrimento do animal, ficando restrita às situações nas quais não há a possibilidade de adoção de medidas. Alternativas;

 

(6) A elaboração de política permanente, sistematizada e eficaz de controle populacional de cães e gatos nos bairros do Município através da castração;

 

(7) O controle do comércio de animais, credenciamento de estabelecimentos comerciais e criadores de animais domésticos do Município;

 

(8) A elaboração e efetiva implementação de legislação específica sobre a guarda responsável, inclusive com a aplicação de sanções administrativas que desestimulem atos atentatórios à saúde, bem estar e dignidade dos animais.

 

(9) Campanhas de educação humanitária/ animal/ ambiental periódicas, informando a população a respeito das normas existentes sobre o tema, da necessidade da tutela responsável de animais, da adoção, de vacinação periódica e de outros serviços públicos (como os elencados acima) e políticas sobre proteção animal;

 

(10) Dotação orçamentária (nos respectivos planejamentos) para a efetivação das políticas elencadas nos itens supracitados, incluindo eventuais contrapartidas financeiras (tais como taxas, tarifas, preços públicos ou contribuições) pelos serviços públicos prestados com observância ao princípio da modicidade das tarifas e observando-se, em especial, a necessária atribuição de gratuidade dos serviços prestados às populações humanas, social e/ou economicamente vulneráveis;

 

(11) Estrutura administrativa e respectivas competências para (a) fiscalização e/ou autuação de eventuais infrações às normas referidas sobre o assunto; (b) criação e funcionamento de Conselho Municipal de defesa ou proteção animal; (c) criação, acesso e uso de valores relativos a um fundo especial de defesa ou proteção animal; (d) realização de controle interno ou externo, bem como controle social sobre a atuação administrativa em matéria de defesa ou proteção animal; (e) participação da sociedade civil (individualmente ou representada por meio de Organizações da Sociedade Civil - (OSCs) nas tomadas de decisões quanto à implementação de políticas públicas de proteção aos animais; (e) realização de convênios com outros órgãos - estaduais e municipais - para reforço mútuo da atuação e fiscalização.

 

Requisita-se, outrossim, resposta escrita quanto às medidas que eventualmente serão adotadas para o atendimento à presente recomendação, fixando-se o prazo de 60 dias a contar do seu recebimento para a devida resposta, bem como, com base no artigo 9o da Resolução 164/2017, a adequada e imediata divulgação da recomendação expedida, incluindo sua afixação em local de fácil acesso ao público, no prédio da Prefeitura Municipal, bem como divulgação ostensiva no sítio da rede mundial de computadores de domínio do Município ou da Secretaria Municipal afim.

 

Remeta-se cópia da presente recomendação à Câmara Municipal de Vereadores, bem como dê-se ciência de sua expedição ao CAOMA.

 

Erechim, 30 de janeiro de 2023.

 

Gustavo Burgos de Oliveira, Promotor de Justiça.





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